domingo, 29 de janeiro de 2012

Made In Brazil

Brasil, produtor e exportador de armas
27.01.12 Por Daniel Santini e Natalia Viana

De maneira pouco transparente, governo incentiva crescimento da indústria nacional de armas e munições. Ênfase é nas armas leves: Brasil é 4º maior exportador mundial. Levantamento inédito do Exército revela que nos últimos 5 anos, exportamos 4,5 milhões de arma!

Uma pequena lata metálica, arranhada e atirada ao chão, gerou o primeiro vexame diplomático brasileiro de 2012. Trata-se de uma lata de gás lacrimogêneo recolhida por ativistas pró-liberdade no Bahrein, no Golfo Pérsico, que estampava na lateral, em azul, a bandeira brasileira e os dizeres “made in Brazil”. (FOTO)

Há um ano o Bahrein tem sido palco de protestos pró-democracia da maioria xiita contra a monarquia sunita comandada pelo rei Hamad Bin Issa al-Khalifa. Os manifestantes têm sido reprimidos pelo exército do Bahrein e de países vizinhos. Pelo menos 35 pessoas morreram e centenas foram feridas.

Segundo os manifestantes, o gás brasileiro está sendo usado para reprimir os manifestantes e teria até causado a morte de bebês. “Há algum tipo de ingrediente que, em alguns casos, leva as pessoas a espumarem pela boca e outros sintomas”, disse a ativista de direitos humanos Zainab al-Khawaja ao jornal O Globo.

Mas, quase um mês depois da denúncia, pouco se sabe como o gás fabricado pela empresa Condor Tecnologias Não Letais foi parar do lado errado da briga.

A empresa, sediada em Nova Iguaçu, no Rio de Janeiro, afirma que não exporta para o Bahrein, mas diz que vende para outros países da região, sem identificá-los.

Toda exportação de armas, mesmo não letais, é aprovada pelo Itamaraty e pelo Ministério da Defesa. Mas, uma vez aprovada, o governo não pode fazer muito. O próprio Itamaraty reconhece que não tem poder de investigar: depois do escândalo do Barhein, a assessoria do Itamaraty informou que o ministério está apenas “observando com interesse” o desenrolar da história.

Fica a cargo da empresa averiguar o que aconteceu.

“É um contrato entre partes privadas. Pode até envolver um governo estrangeiro, mas a responsabilidade pelo seu produto é da empresa”, diz a assessora de imprensa do Itamaraty. “Os contratos geralmente proíbem a revenda. A Condor está tentando rastrear o seu produto, estamos num diálogo permanente.”

A situação é pior porque não existe legislação internacional para o comércio de armas leves. “No caso de armas não convencionais, a atuação do Itamaraty é mais direta, mas no caso de armas convencionais, não existe um regime internacional para que a gente possa aconselhar em algum sentido”, reconhece.
Leia a parte 2: Empresas de armas miram África e Ásia para ampliar exportações
Leia a parte 3: Em cinco anos, 4,5 milhões de armas nas ruas
Leia a parte 4: A bancada da bala

Nesse contexto, é bem provável que casos como esse aconteçam cada vez mais. Enquanto o comércio de armamentos pesados, como os super tucanos, costuma chamar a atenção da imprensa nacional, é no ramo de armas leves que o Brasil tem uma atuação pungente e crescente no mercado internacional.

Segundo dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), o valor das exportações de armas leves triplicou nos últimos cinco anos: foi de US$ 109, 6 milhões em 2005 para US$ 321,6 milhões em 2010 (em 2011, houve um recuo para US$ 293 milhões).

Contando apenas as armas de fogo, a quantidade impressiona. Foram 4.482.874 armas exportadas entre 2005 e 2010, segundo um levantamento inédito do Exército feito a pedido da agência Pública. Ou seja: 2.456 armas por dia.
O Exército se negou a dar detalhes como venda ano a ano, empresas exportadoras e países de destino.

Assim, cabe às ONGs internacionais tentar desvendar os detalhes da exportação brasileira.
Todo ano, o Instituto de Estudos Internacionais e de Desenvolvimento, em Genebra, realiza o Small Arms Trade Survey, o mais respeitado estudo sobre essa indústria. Em 2011, o Brasil foi o 4º maior exportador mundial de armas leves, atrás apenas dos Estados Unidos, Itália e Alemanha.

Contando somente armamentos pesados, somos o 14º, de acordo com o Instituto Internacional de Estudos da Paz de Estocolmo (SIPRI). Nos dois casos a liderança é dos Estados Unidos, com larga vantagem.

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